quinta-feira, 31 de outubro de 2013

D. Leopoldina - Who let the dogs out

Todos sabem que a Imperatriz Leopoldina morreu infeliz. Seu casamento estava arruinado pela relação entre D. Pedro e a Marquesa de Santos, estava doente e grávida do nono filho do Imperador, que a via como a "reprodutora".
Porém, na literatura tudo é possível. Paulo Setúbal, em seu livro "A Marquesa de Santos", criou um romance em que D. Leopoldina obteve direito de responder ao escândalo de D. Pedro I.

"Leopoldina, nos aposentos, estava com as suas malas abertas, pilhas de roupa branca pelos móveis, vestidos espalhados pelos divãs.
D. Pedro empurrou com violência a porta do quarto. Entrou. E ao dar com aquela desordem, aqueles preparativos, aquelas malas escancaradas:
- Que é isto?
D. Leopoldina tinha uma serenidade decidida, imperturbável. Respondeu friamente:
- Não é nada. Sou eu que me vou embora do Paço.
- Vossa Majestade vai-se embora do Paço?
- Vou para o Convento da Ajuda. No meio de monjas é que deve morar uma Imperatriz sem marido.
D. Pedro nunca houvera visto, até aquele instante, D. Leopoldina tão resoluta. Era de pasmar! A Imperatriz continuou:
- Já mandei que as malas de Vossa Majestade fossem transportadas para a casa da Sra. Marquesa de Santos. Vossa Majestade, que não se coíbe de passar dias inteiros em companhia dessa mulher, naturalmente irá morar, de hoje em diante, definitivamente, em casa da adúltera.
- Vossa Majestade enlouqueceu? Mas Vossa Majestade não vê o escândalo?
D. Leopoldina fitou-o cara a cara, sobranceira e escarnecedora:
- E Vossa Majestade que tem a ousadia de me falar em escândalo? Pois o que faz o Imperador todos os dias, nestes últimos anos, senão escândalos? e mais escândalos? Que é Vossa Majestade, neste momento, com a sua amante pública, senão o mais escandaloso de todos os homens?
D. Pedro escutou aquilo com fúria. Tinha o olhar congesto, o aspecto revolto.
- Vossa Majestade se contenha! Vossa Majestade se contenha!
- Basta, Sr. D. Pedro, basta! Eu já estou farta de suportar tantas humilhações! Vossa Majestade esqueceu-se de que sou filha de Imperador; de que sou mulher de Imperador; de que sou mãe do futuro Imperador. E não se pejou, para humilhar-me, de fazer da sua amante a Sra. Marquesa de Santos! Não se pejou de reconhecer, por um decreto, menoscabando assim em público a honra de sua esposa, o fruto ilícito desses amores. Não, Sr. D. Pedro! Não! É demais. A taça transbordou. Vá viver com a divorciada! Mas deixe-me a mim, Imperatriz sem marido, ao menos a felicidade de viver em paz, num convento, longe de tanto horror...
D. Pedro não se conteve. Dentro de sua alma, despertou-se o bruto, o homem das cavalariças, aquele domador de potros que vivia adormentado no sangue de Sua Majestade. E agarrando a Imperatriz pelo pulso, num ímpeto de calceteiro, D. Pedro ergueu a mão no ar... Ergueu a mão pronto para desabar a tapona! Foi uma cena de relâmpago, hedionda. D. Leopoldina, soberbíssima, sentiu ferver lhe nas veias todo o velho sangue dos Habsburgos. E, com os olhos chispantes, magnífica de cólera:
- Vamos! Dá na tua mulher! Espanca a mãe de teus filhos! Faze esse ato heróico! Vamos, Sr. D. Pedro! Bate na Imperatriz do Brasil! Vamos, bate!
E fitou-o de alto a baixo. Fitou-o com formidável, esmagado arrogância. D. Pedro abaixou o braço...
- Não, Sr. D. Pedro, não foi para "isto" que Vossa Majestade foi buscar-me na Áustria! Vir ao Brasil, a este fundo pedaço da América, sozinha, sem parentes, para ser assim ultrajada pelo marido! Para ser humilhada como sou, todos os dias; oh, Sr. D. Pedro, não, não foi para isso que Vossa Majestade me arrancou do palácio do meu Pai!
E como se não pudesse represar a onda que lhe subia da alma, D. Leopoldina sentiu as lágrimas saltarem-lhe dos olhos, caírem-lhe aos borbotões, num grande desabafo aliviador.
D. Pedro, aquele impulsivo, aquele arrebatado, comoveu-se de pronto. E diante da mulher que soluçava, diante daquele sentido despencar de lágrimas, invadiu-lhe a alma, transbordando-a, o velho sentimentalismo da raça. E já arrependido, e já vencido, e já com os olhos molhados:
- Perdão, Leopoldina...
Atirou-se bruscamente aos pés da mulher. E com a voz estrangulada:
- Minha Leopoldina! Minha boa Leopoldina! Perdão... Eu tenho sido indigno de ti!"

D. Leopoldina who let the dogs out! Adoraria ler que isso foi real... tadinha, pelo ou menos aqui ela obteve direito a dizer tudo o que sua postura de esposa real submissa nunca permitiu.

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